Factos e Pressões: Os Desafios Éticos do Jornalismo em Angola

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Nos últimos anos, os jornalistas têm utilizado a ética jornalística como um dos principais pilares da credibilidade da informação através de um processo de domínio e respeito às normas e comportamentos que constroem a confiança do público.

Mas há diversos obstáculos para a utilização desse pilar tão importante na comunicação. As pressões políticas, as restrições à liberdade de imprensa, o desrespeito a liberdade de expressão, a criminalização da crítica, o baixo salário dos profissionais da comunicação social, a corrupção e as detenções arbitrárias são os principais desafios que precisamos enfrentar para a melhoria da ética jornalística em Angola.

Essas são algumas das conclusões da minha palestra sobre os “Fundamentos da Ética Jornalística”, apresentada no Workshop sobre “Ética, Deontologia e Metodologias de Investigação Jornalística”, na quinta-feira, 20 de Novembro, na cidade do Lubango, província da Huíla, numa acção organizada pela Associação Pro Bono Angola em parceria com a Financial Services Volunteer Corps (FSVC).

Entendemos que o contexto em que nos encontramos tem sido marcado pela velocidade da desinformação que parece estar a concorrer ou a superar o rigor da apuração jornalística, mediante a colecta, verificação e análise de dados. Nesses contextos, é necessário e um imperativo democrático revisitarmos cada vez mais os fundamentos éticos.

Os escritos de Daniel Cornu mostram que “o jornalismo só cumpre o seu papel quando se ancora na responsabilidade e na verdade”. No nosso país, essa âncora é constantemente testada por pressões políticas, económicas e sociais que moldam o comportamento dos profissionais de comunicação social.

Parece-me que não há muitos jornalistas que desconhecem o assunto, especialmente quando falamos dos dilemas éticos, que atravessam as redacções diariamente e não são abordadas com profundidade. A interferência política, o sensacionalismo, a manipulação de narrativas e a autocensura colocam em cheque a integridade jornalística.

Kovach e Rosenstiel (2001) reforçam que “a primeira obrigação do jornalismo é com a verdade”, mas em Angola, isso implica resistência frente à censura, coragem para fiscalizar os diferentes poderes e a disciplina para verificar os factos antes da publicação.

A desprofissionalização do sector representa outro desafio crítico. Embora tenhamos formalizado a Comissão da Carteira e Ética (CCE) e aprovado o Código de Ética dos Jornalistas Angolanos, ainda temos verificado a entrada de colegas sem formação sólida, adequada e a ausência de políticas robustas de capacitação, o que fragiliza a qualidade jornalística do país.

Ruellan (1993) descreve este fenómeno como a “liquefação da profissão”, onde a falta de rigor e a busca por audiência imediata comprometem o valor da informação. É neste aspecto em que a ética posiciona-se como mecanismo de defesa da credibilidade e da função social do jornalismo.

Cumprir a ética não depende apenas de códigos escritos, mas de atitude e comprometimento. A Carta Internacional de Ética dos Jornalistas (IFJ, 2019) estabelece que o jornalista deve defender exactidão, imparcialidade e integridade.

No contexto angolano, essa tese exige autonomia, coragem para enfrentar pressões externas, e a capacidade de agir com responsabilidade social. As instituições reguladoras, como a Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana (ERCA) e a CCE, desempenham papel essencial na promoção de uma cultura de rigor ético, garantindo que os profissionais e as redacções mantenham padrões de conduta elevados.

Defender a ética jornalística em Angola é, acima de tudo, defender a democracia, pois entendemos que informação precisa e responsável é um bem público. Quando mal tratada, torna-se arma; bem tratada, torna-se liberdade.

O jornalista ético é guardião da transparência, mediador do debate público e construtor de confiança social. O futuro do jornalismo angolano depende da capacidade de cada profissional e de cada instituição de assumir esse compromisso com coragem, seriedade e serviço ao cidadão. Sem ética, não há jornalismo; sem jornalismo, a democracia perde-se na esquina ensinada pelo meu mestre Aguiar dos Santos, in memoriam!

Gratidão com Resiliência&Fé!

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Fernando Guelengue é jornalista, pesquisador científico pela Associação Científica de Angola e tem ajudado líderes, empreendedores e profissionais a dominarem a arte da Oralidade Africana e do Jornalismo.

Fundador e CEO da SELUTU, Guelengue tem domínio aprofundado em Psicologia e Mestrando em Administração e Direcção de Empresas pela ENEB.

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