Carolina Maria de Jesus foi uma escritora e poeta brasileira que se tornou conhecida do grande público a partir da publicação de seu livro “Quarto de Despejo”.
Negra, moradora da favela (conjunto de habitações precárias) do Canindé, na cidade de São Paulo, exercendo trabalhos de subemprego (como coletora de materiais recicláveis, por exemplo), Carolina Maria de Jesus foi vista, imediatamente, como uma figura exótica. Nas palavras de Elena Pajaro Peres, pós-doutora do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo (USP), no documentário intitulado Poética da Diáspora,[1] “a questão da carência e da precariedade material […] criou uma visão da Carolina como uma escritora da carência, uma coisa surpreendente ou algo milagroso até”.
A pesquisadora nos adverte dos perigos de se emergir dentro dessa lógica, valorizando o trabalho de Carolina Maria de Jesus somente enquanto ele preenche o imaginário da extravagância e do excêntrico. Depois da publicação de “Quarto de Despejo – Diário de uma favelada”, a escritora publicou um segundo livro em que transcendia a imagem criada sobre ela como se fosse uma personagem ficcional. O livro “Casa de alvenaria – diário de uma ex-favelada” não alcançou o mesmo interesse de público. Ao que consta, não foi bem recebido e Carolina de Jesus recebe o conselho de parar de escrever. Conselho esse que ela não acatou, mas pelo qual pagou o preço da invisibilização: os leitores não se interessaram pela escritora que transcendeu a situação de miséria!
O nome de Carolina Maria de Jesus está a receber novas atenções. O Museu Afro-Brasil, de São Paulo, por exemplo, mantém a Biblioteca que leva o nome da escritora. Trata-se de um acervo riquíssimo de obras de variados autores com temática relativa à história e cultura dos africanos e seus descendentes.
A unidade do SESC (Serviço Social do Comércio) da cidade de Sorocaba abriu no dia 15 de junho a Exposição “Carolina Maria de Jesus: um Brasil para os brasileiros”. Voltada a uma visão crítica sobre como a figura da escritora foi apropriada pelos seus contemporâneos, essa exposição conta com painéis, exposição de fotos e documentos, material multimídia, intervenções artísticas e reproduções de trechos dos livros de Carolina. O material de divulgação do evento dá uma ideia sobre a exposição:
“A exposição “Carolina Maria de Jesus: um Brasil para os brasileiros” é dedicada à trajetória e à produção literária da autora mineira que se tornou internacionalmente conhecida com a publicação de seu livro “Quarto de Despejo”, em agosto de 1960. Tem como objetivo apresentar sua produção autoral que incluiu a publicação, em vida, de outras obras, além de destacar suas incursões como compositora, cantora, artista circense – uma multiartista. Protagonista importante da história do Brasil, embora invisibilizada muitas vezes, Carolina tem um papel particularmente significativo para a história da população negra brasileira. A exposição apresenta a autora como uma intérprete imprescindível para compreender o país. Carolina Maria de Jesus: um Brasil para os brasileiros é resultado de um enorme esforço para destacar a grandeza da escritora e apresentar Carolina Maria de Jesus como convém: mulher negra e artista emancipada, símbolo de resistência e de luta política e cultural para o país”.
A exposição conta com a curadoria de Hélio Menezes e Raquel Barreto e a assessoria de Luciara Ribeiro. A Pesquisa de literatura leva a assinatura de Fernanda Miranda. Já a Pesquisa de cinema e audiovisual foi realizada por Bruno Galindo. O Projeto Expográfico é de Isabel Xavier e o Projeto Gráfico foi realizado pelo Estúdio Daó. A exposição é uma realização conjunta do SESC e do Instituto Moreira Sales (IMS).
Esta é a segunda vez que Carolina Maria de Jesus aparece triunfal na cidade de Sorocaba. Ainda em vida, a escritora e poetisa esteve na cidade para lançar seu livro “Quarto de despejo” no dia 27 de setembro de 1960. Na Livraria Gutierrez, hoje inexistente, realizou-se a noite de autógrafos. No mesmo dia, horas antes, a escritora realizou uma palestra no Gabinete de Leitura Sorocabano. A reportagem realizada na época salientou o desequilíbrio social do Brasil que produzia seus “quartos de despejo”, inclusive em Sorocaba. E terminava a nota salientando a importância do esforço conjunto da sociedade para mudar aquela realidade. E foi Carolina quem despertou a atenção para a triste realidade da desigualdade social.
Carolina Maria de Jesus é essa mulher fantástica que continua nos ajudando a enxergar um Brasil para os brasileiros.
A exposição no SESC Sorocaba vai até o dia 25 de setembro, de terça a sexta, das 9h às 21h30; sábados, domingos e feriados, das 10h às 18h30. A entrada é gratuita.
[1] https://www.youtube.com/watch?v=T0ncwWD1C9g&t=17s
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Carlos Carvalho Cavalheiro é Mestre em Educação (UFSCar), Licenciado em História e Pedagogia Bacharel em Teologia, Especialista em Metodologia do Ensino de História e em Gestão Ambiental e Historiador brasileiro registrado no ME sob nº 317/SP.