A sociedade angolana, assim como muitas outras ao redor do mundo, está a atravessar uma fase de transformação profunda, impulsionada pela sociedade da informação, na qual o uso, a criação, a distribuição, a manipulação e a integração da informação se tornaram actividades essenciais.
Conhecida como a Era da Informação, essa transformação entrou nas nossas residências e vidas de maneira impositiva, trazendo consigo uma quantidade infinita de conteúdo acessível a qualquer hora e em qualquer lugar.
As plataformas digitais de streaming, as redes sociais e os jogos online tornaram-se uma parte indispensável da vida quotidiana, oferecendo conteúdos de fácil acesso com investimentos relativamente baixos.
Embora o entretenimento seja fundamental para o bem-estar e uma forma legítima de escape da rotina estressante dos dias actuais, a mentalidade voltada exclusivamente para o entretenimento em Angola apresenta desafios únicos que precisam ser enfrentados, tanto para o equilíbrio pessoal quanto para o desenvolvimento colectivo da sociedade.
Em Angola, onde o acesso à internet e às tecnologias digitais tem crescido rapidamente nos últimos anos, o consumo de entretenimento tem se acelerado de forma considerável.
Essa facilidade é intensificada pelo acesso a filmes, músicas, notícias e conteúdos diversos, muitas vezes se sobrepondo a actividades mais construtivas, como a leitura, o aprendizado e a participação nas antividades culturais que promovem o crescimento pessoal e o fortalecimento da identidade nacional.
As viralizações frequentemente envolvem conteúdos de pouco valor construtivo, contribuindo para uma “embecilização” generalizada. A sociedade parece estar a ser conduzida por uma agenda global que mantém os africanos afastados da conscientização sobre o verdadeiro valor das suas terras, que, há séculos, têm sido o canteiro de colheita de riquezas para o ocidente.
Embora essa realidade seja ainda mais intensa nas principais cidade do nosso país, ela não é exclusiva de Angola. A rápida adaptação à era digital, somada à falta de uma educação voltada para o uso saudável da tecnologia, cria um terreno fértil para o desenvolvimento de uma “mentalidade do entretenimento”.
Esse termo que decidi apresentar se refere ao comportamento de consumir conteúdo digital de forma incessante, muitas vezes sem reflexão crítica ou equilíbrio. Quando o entretenimento se torna o principal foco de nossas vidas — seja ao acordar ou ao dormir — ele pode resultar num empobrecimento das experiências e das relações sociais, limitando nossa capacidade de nos engajarmos com a realidade e com os outros.
O entretenimento digital é, sem dúvida, uma ferramenta poderosa. No entanto, quando consumido de forma descontrolada, sem uma estrutura que oriente o seu uso, pode se tornar uma forma de fuga.
No nosso país, especialmente entre os mais jovens, existe um risco crescente de que a mentalidade voltada para o entretenimento leve a interacções sociais superficiais e a uma desconexão com a cultura e os valores que moldam a sociedade. Isso é preocupante, pois uma sociedade que perde o contacto com as suas raízes culturais e com valores fundamentais como o respeito, a ética e a reflexão crítica, corre o risco de se tornar desorientada e vulnerável diante dos desafios impostos pelo mundo moderno.
É nesse contexto que a educação surge como uma ferramenta crucial. O sistema educacional em Angola precisa ir além da simples transmissão de conteúdos técnicos e académicos. A formação de cidadãos críticos, conscientes e engajados com o seu tempo e a sua cultura deve ser uma prioridade, longe das influências do militantismo partidário.
Essa educação deve ser voltada para os valores morais e culturais, pois é essencial garantir que as futuras gerações saibam equilibrar a riqueza do mundo digital com a profundidade das tradições que formam a base da identidade do nosso povo.
Ao pensar nessa questão, durante o lançamento do Programa de Mentoria Comportamental “Seja Uma Pessoa Melhor”, que atende tanto adolescentes quanto adultos, algo me chamou a atenção: um adolescente angolano foi incapaz de falar sobre Angola por 10 minutos. Isso reflectiu uma pobreza de conhecimento alarmante, algo que só a sociedade da informação, com sua oferta interminável de conteúdo superficial, poderia ter causado. Foi o vazio do nada.
DESENVOLVIMENTO PESSOAL
Foi então que decidimos expandir a Mentoria Comportamental para mais jovens angolanos, com a intenção de trabalhar, nos próximos meses, de forma mais intensiva no ambiente online. Aproveitaremos a Era da Informação para alcançar mais adolescentes e adultos, combatendo os efeitos negativos da mentalidade de entretenimento, por meio de uma mensagem focada no desenvolvimento pessoal e profissional alinhado aos valores de nossa identidade cultural.
Centrada no autoconhecimento e na responsabilidade individual, essa mentoria ajuda tanto adultos quanto adolescentes a reflectirem sobre os seus comportamentos e a encontrarem um equilíbrio saudável entre o uso das tecnologias e os aspectos essenciais da vida humana.
Essas práticas podem ser o ponto de partida para reverter o quadro actual, incentivando a construção de uma mentalidade mais consciente e equilibrada. No entanto, não é apenas a educação formal ou os programas de mentoria que têm o poder de mudar a mentalidade de entretenimento em Angola.
Famílias, líderes comunitários, instituições culturais e até mesmo as plataformas digitais desempenham um papel importante nesse processo. Incentivar um consumo mais consciente de conteúdo, fomentar o envolvimento com a cultura local e promover actividades que estimulem a reflexão e a interacção social são passos fundamentais para combater o ciclo vicioso da distração digital.
O entretenimento não precisa ser o vilão. Pelo contrário, pode ser uma ferramenta positiva, desde que seja utilizado de maneira equilibrada e consciente. A chave para isso está na educação, que deve não apenas ensinar as habilidades tecnológicas, mas também reforçar a importância dos valores humanos, culturais e sociais. Só assim Angola poderá navegar pelas águas da sociedade digital moderna sem perder o foco no que realmente importa: a construção de uma sociedade mais sólida, ética e conectada com as raízes culturais.
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Consultor Empresarial, Empreendedor, Palestrante, Jornalista, antigo editor do Semanário Agora, CEO e Fundador do Portal de Notícias Culturais Marimba Selutu, colaborador do Portal de Notícias Por dentro da África, Escritor, Formado em Psicologia e Membro-Fundador da Associação Científica de Angola.
Artigo leva-nos a perceber o quanto e necessário nós situamos no tempo e perceber o grande desafio que as tecnologias nos oferece,, e o real sentido das tecnologias nas nossas vidas