De uma áurea diferente dispontou dum meio dos improváveis, cuja marginalização é protótipo de muitos lugares, onde a extrema pobreza, a desestruturação urbana, insegurança e a incerteza de um amanhã/amanhecer ou acordar constituem-se em milagre.
Assim fazem-se os homens que desafiam o seu meio e impõem-se contra tudo e todo(a)s (adversidades), no/do seu tempo.
A vida é um labirinto. “Da cimeira à baxera, do beco à principal”, depreende-se por uma luta pela sobrevivência, ante os altos e baixos da vida (cima vs. baixo), sobretudo, no Paraíso e demais subúrbios/zonas periféricas-guetos ou Musseques de Luanda (Angola), em que, a insuficiência ou ausência dos equipamentos sociais, ou seja, os serviços sociais integrados, beliscam a felicidade dos agregados sociológicos neles adstritos.
Tinha sonhos e esperança, na certeza de que fazia não só por ele e sua família, mas “Pelo Povo”.
Aborda as disputas entre grupos nas comunidades periféricas, “o granil(lutas)” entre bairros que os de cima não pudessem chegar nas ruas de baixo. Mostra a falta de ruelas que ligam as ruas, daí o facto, de que para se chegar na rua ‘principal’ tem de se entrar por um beco ou vários becos(…).
A vida tem vários becos que se precisa sair. E ele, Mano Chaba sai destes becos e alcança a rua/via ou estrada principal. Na qual, procurou se manter, mas em pouco tempo, pois o outro beco sem saída o acolheu. Os caminhos da vida e os detalhes do labirinto o silenciaram. Vida curta, grande e honrosa luta!
Com letra limpa, cadência boa e musicalidade resiliente, eivada de originalidade contagiante, denotou uma força telúrica de quem cantava com alma/espírito, ao ponto de emocionar-se e, emocionar também, quem o aprecia. O Mano foi bom.
Das suas melodias transmitia instruções, conselhos e esperanças por dias melhores, para quem com crença e dedicação buscasse semear com suor, para comer o seu pão da justiça, com alegria: “Num bumba/Mas fala vai ser rico/pelo menos um rasso/p’ra te tirar dos picos.(girar mundo).
O artista repugna a preguiça, o espírito da busca pela vida fácil e caminhos obscuros advindos da inveja pelo bem-estar ou sucesso/conforto do outro, que se posiciona, dada a sua luta ou sacrifício: “(…) por eu cantar/num ta curtir dum gajo/ foi no kimbanda/pra vir taku a taku…”
Tão jovem, mas com uma profunda compreensão dos factos e das agruras da vida, sem deixar de fora o tecido social que definha, canta o drama do “Menino de rua” O flagelo da fome: “Vou falar verdade num vó scomdê nada/ comida apertada tipo aqui mandaram praga. (..) Abri a panela estava fofo”… A prostituição: “As nossas irmãs estão a se vender por nada/ já não importa a idade todas dançam” … O roubo: “( …) e de repente vi bwé de povo/ gritar gatuno/.. Me bateram com pedra…/ queriam me matar tipo kalebe… e outros cenários e situações da vida, nas suas letras.
Em seis meses de estrada fez-se notório, como um ribombar de trovão ou um vulcão em erupção, cujas águas do mar serviram de corta-corrente, do apagão, para que o manto negro tecesse o breu que tingiu de luto os corações da humanidade. Vinha com garra, galgando e palmihando passos em busca de afirmação.
Crente e ciente na força de Deus, nos beneplácitos do Espírito Santo e na graça de Cristo. Aliás, fiel desde o berço, acredita no poder da “Oração”, fez da sua mãe, a predilecta e Santa devota não desmotiva só motivação”, “não tenta” e “minha mãe está a fazer oração”.
Transpareceu sempre inocência no olhar, fronte bem anuviada preenchida de sorrisos contagiante, com um kuyuyu e adoço puro. No seu canto embebido da poesia e recriação linguageira típica da gramática do gueto, cujo liricismo não descrevia o veneno da ilusão, mas a convicção de quem sabia o que queria.
– (…) Não maia dá pilha/ dá pilha no teu tropa do guetão/ … O Povo chama/Mano Chaba do Chabá/dá mesmo pilha no tropa(puto) que está carregar (…) fala da necessidade de unidade entre membros da mesma comunidade.
Lutou e colocou o seu Muní (Município de Cacuaco no mapa), com destaque ao Bairro Paraíso, Distrito Urbano do Kicolo,… Mulenvos e arredores. Facto que inverte a matriz da geodescrição do estilo predominante no Sambizanga, Rangel, Cazenga e (…), em que ele carimbou-se com punho firme e letras de ouro, como a maior promessa de todos os tempos.
O seu malograr na beira do rio (mar) deixa esta nostálgica sede de se lhe puder(querer) ouvir e ver cantar e/ou trazer novos trabalhos, mas infelizmente…
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Mozier Jocand (Moisés Candumbo) é escritor, docente, pesquisador, ensaísta, politólogo e filósofo. Comentarista para questões da realidade social e cultural angolana na Rádio I. B ( ex-Rádio Cacuaco), do Grupo RNA e noutras estações.