O concurso Miss Costa do Marfim abalou o mundo da beleza ao proibir o uso de perucas, extensões e apliques capilares nas suas eliminatórias para 2025. Esta regra, que abrange competições em 13 cidades marfinenses e duas vagas para a diáspora, exige que as candidatas exibam o seu cabelo natural — seja ele longo, curto, entrançado ou rapado. Victor Yapobi, presidente do comité organizador, declarou à BBC: “Queremos que as candidatas sejam naturais…
A beleza deve ser autêntica.” Inspirado por vencedoras anteriores como Marlène-Kany Kouassi, que conquistou a coroa em 2022 com um Afro curto, este movimento pretende celebrar a beleza africana genuína. Contudo, este passo audacioso suscita um debate mais profundo: será isto libertação ou apenas uma nova imposição?
A história oferece contexto. Nos Estados Unidos, académicos negros frequentemente traçam a evolução do cabelo das mulheres negras desde as tradições africanas, passando pela escravatura, até aos movimentos pelos direitos civis. Após a emancipação, o cabelo alisado — como os produtos pioneiros de Madam C.J. Walker no início do século XX — prometia aceitação num mundo dominado por padrões brancos. Na década de 1970, o Afro tornou-se um símbolo de rebeldia, uma rejeição dessa norma.
Hoje, comunidades online impulsionam um renascimento do cabelo natural, partilhando dicas no YouTube e em blogues para evitar os danos causados por alisadores químicos. A proibição na Costa do Marfim alinha-se com esta mudança, ecoando o orgulho de Emmanuella Dali, uma vencedora: “Esta regra dá-me ainda mais orgulho enquanto mulher africana.”
Mas será que impor o cabelo natural liberta verdadeiramente as mulheres, ou apenas substitui um padrão por outro?
A intenção do concurso — abandonar ideais ocidentais como cabelos longos e lisos — ressoa com um movimento global contra a beleza eurocêntrica. O cabelo natural desafia os padrões rígidos da feminilidade branca, um ponto que Yapobi reforça ao rejeitar também cirurgias estéticas e o branqueamento de pele. No entanto, críticos apontam preocupações com a conformidade forçada.
Esta decisão impacta igualmente um setor económico de grande escala. O mercado global de cabelo artificial negro foi avaliado em 3,2 mil milhões de dólares em 2024, com projeções de alcançar quase 5 mil milhões até 2033. Apenas as perucas e extensões capilares geram mais de 10 mil milhões de dólares em vendas globais, com a América do Norte a deter cerca de 40% do mercado.
A cadeia de valor estende-se desde fabricantes e fornecedores até retalhistas, profissionais de salões de beleza e influenciadores digitais — criando meios de subsistência em vários continentes. Ao rejeitar estes produtos, o concurso não só desafia padrões de beleza, mas também perturba um complexo ecossistema económico que prosperou em torno das escolhas capilares das mulheres negras.
As mulheres negras beneficiam pouco economicamente de uma indústria de cabelo negro que gera milhares de milhões.
A maior parte da produção ocorre na Índia, China e Brasil, com os produtos a serem distribuídos através de negócios de propriedade asiática em comunidades predominantemente negras na América do Norte.
Perucas de alta qualidade podem atingir preços superiores a 5.000 dólares, mas a cadeia de valor começa com mulheres em templos indianos que doam ou vendem o seu cabelo para ser transformado em produtos destinados a consumidoras negras.
Esta disparidade é particularmente marcante — mais recursos financeiros são canalizados para melhorar a aparência externa das mulheres negras do que para investir em oportunidades de desenvolvimento educacional e intelectual para esta mesma comunidade. Este desequilíbrio económico representa uma alocação preocupante de recursos e sublinha a necessidade de maior propriedade e participação negra em toda a cadeia de abastecimento de uma indústria construída com base no consumo negro.
As preocupações com a saúde adicionam outra camada a este debate. Investigações recentes revelaram níveis alarmantes de substâncias tóxicas em cabelos sintéticos para tranças, incluindo benzeno (um carcinogéneo conhecido), chumbo e irritantes respiratórios como a acetona.
Estudos associaram produtos capilares comercializados para mulheres negras a perturbações endócrinas, problemas de saúde reprodutiva e riscos acrescidos de cancros, incluindo os de mama, ovário e útero. Estilos de tranças muito apertadas podem causar alopecia por tração — perda permanente de cabelo devido ao stress excessivo nos folículos capilares —, enquanto materiais sintéticos frequentemente provocam irritações no couro cabeludo e reações alérgicas.
A questão central é a liberdade de escolha. Críticas, como a concorrente Astrid Menekou, lamentam a perda de expressão; as perucas, um elemento tradicional na África Ocidental, protegem o cabelo e estimulam a criatividade. O cabelo alisado também pode ser político, o seu significado moldado pelo contexto, não pela textura. Um bob elegante numa sala de reuniões hostil pode ser tão desafiador quanto um Afro num palco.
A regra da Costa do Marfim, porém, presume que apenas o cabelo natural define a negritude. Alguns aplaudem esta medida — a youtuber Heal with Mare celebra-a como uma forma de abandonar as “perucas coloniais” —, mas outros questionam por que forçar o cabelo natural não é visto como opressivo, quando as perucas o são.
A aposta da Costa do Marfim é corajosa. Desafia um mundo de concursos impregnado de brilho ocidental, oferecendo um espelho às mulheres negras globalmente. Mas não deve cristalizar-se em dogma. As mulheres devem usar o que escolherem — natural ou não — sem vergonha ou imposição. Com a final de junho no horizonte, esta experiência pode inspirar, mas apenas se honrar a liberdade em vez da coerção. Caso contrário, é apenas uma coroa com trela.