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Apesar de ser um dos candidatos ao cadeirão máximo da União Nacional dos Artistas e Compositores – Sociedade de Autores (UNAC-SA), Zeca Moreno revela o momento do começo da sua carreira artística, os caminhos para atingir o apogeu, bem como as particularidades que estiveram por detrás do sucesso dos Bongos, nos anos 80.

O benguelense e também funcionário da administração pública no Gabinete Provincial do Comércio e Indústria do Governo de Luanda, confirma igualmente que vai continuar a trabalhar no seu novo álbum e se for eleito na UNAC-SA trabalhará com todos os estratos da sociedade para tornar a música uma profissão devidamente reconhecida

Zeca Moreno é o nome que faz parte dos artistas da geração dos anos 60. Explica-nos como entra no mundo da Arte em geral e da Música em particular?
Como um jovem do meu tempo, comecei a ter o gosto pela música desde muito cedo. E naquele tempo, nos anos 60, não havia muitas alternativas para o ingresso à música: as que existiam eram as turmas de Luanda. E no caso da província onde nasci e vivi (Benguela), eram apenas os grupos de carnaval. Foi por aí onde entrei no mundo artístico como membro de carnaval e tocava batuque sem grande técnica. Portanto, o carnaval é barulho, é folia e alegria. Mas, comecei a levar a música mais a sério ou de uma forma mais responsável, nos anos 70, com o surgimento dos Bongos. Portanto, praticamente nasço como cantor, quando nascem também os Bongos.

Foi nesta altura em que começou a cantar a solo?
Exactamente.

Os Bongos são considerados como um dos melhores grupos da década 70 e 80, partilha dessa opinião?
Partilho sim, porque é um facto! Pelo menos na parte Centro e Sul de Angola, onde os conjuntos de música pop eram os que mais imperavam, quando os Bongos apareceram fizeram a diferença e foi um registo da nossa angolanidade naquela parte do nosso País. Pois, em Luanda, fruto dos contactos que a capital de qualquer país tem com o exterior, a música despontou-se muito mais cedo com o Liceu Vieira Dias e muitos outros, que já são conhecidos na nossa essência musical. Já o nosso caso, os dos Centro, eram mais os conjuntos de música moderna.

Enquanto conjunto, que agora nós chamamos de banda, os Bongos foram, de facto, marco bastante importante

Quais eram os estilos que faziam?
Os conjuntos de música moderna dedicavam-se mais ao rock, ou seja, mais em músicas internacionais. Mas, em relação as nossas músicas de Angola, fomos nós, os Bongos, que praticamente, naquela parte do País, começámos a mostrar como conjunto. Sem considerar que também haviam outras pessoas como Augusto Cordeiro, o Tchikuto, o Zé Viola e muitas. Portanto, são pessoas que já estavam na música. No entanto, enquanto conjunto, que agora nós chamamos de banda, os Bongos foram, de facto, marco bastante importante.

Os estilos eram, naquela altura, mais centrados naquilo que é a angolanidade. Mas, quais eram as línguas utilizadas?
Como deve compreender, nós somos do Centro-Sul e a língua predominante é o Umbundu. Não só cantávamos em Umbundu, mas também em português, pois considero ser uma língua nacional, já que é a língua ao qual adoptamos durante todos estes séculos de colonização. Ela, a língua, já faz parte do nosso património cultural. Neste caso, fazíamos imitações de músicas com estas línguas que já se cantavam aqui, em Luanda, como por exemplo as músicas do Kiezos e dos Jovens do Prenda.

Quem eram os membros dos Bongos e quais foram os papéis de cada um?
Eu era um artista individual, que fazia parte do elenco artístico permanente dos Bongos. Este conjunto tinha um núcleo principal, que eram os instrumentistas. Nesse caso, eram o Marques Trindade, que era o chefe do conjunto; Botto Trindade, o Tiquinho, o Gonzagas, o Costa Júnior, o Vieira, tamborista; e o Quinino, irmão menor de Botto Trindade, que é falecido. Este último, tocava viola baixo e ritmo, tendo dado igualmente a sua contribuição por muito pouco tempo. O Marques Trindade é o mais velho dos dois. Na altura, eu (Zeca Moreno) e Júlio Tomás, éramos os dois principais suportes vocais, para além do conjunto. Portanto, os Bongos não só tinham este núcleo duro, mas também tinha artistas que os acompanhavam em todos espectáculo e diversões.

Entre as músicas que se destacaram naquela altura, pode recordar algumas que foram mais tocadas?
São várias músicas. O Vieira, por exemplo, cantava muito as músicas de Franco, enquanto eu interpretava algumas músicas brasileiras, para além as de minha autoria, pois na época, já escrevia alguma coisa. O Júlio Tomás interpretava também música da sua autoria. Portanto, éramos mais ou menos uma miscelânea, isto é, éramos desta forma que funcionávamos.

Eu sempre levei a música como uma coisa séria, uma coisa responsável e de respeito

Afirma que não é um artista profissional, então a música serviu de um suporte para ascensão para outras actividades profissionais?
Não é bem para ascensão! Eu sempre levei a música como uma coisa séria, uma coisa responsável e de respeito. A verdade é que, para além da música, eu tinha outras ocupações: estudava, até completar a minha licenciatura ou curso superior; trabalhava, porque eu tinha uma outra profissão – na altura, quando estivéssemos de férias escolar, eramos obrigados, pelos nossos pais, a irmos aprender umas profissões numa oficina, as quais foram serralharia e soldadura. Por conseguinte, eu partilhava a minha vida artística com o meu emprego e a escola.

Sempre viveu dessa maneira?
Sim! Por isso, é que actualmente tem estado a ocupar cargos políticos e administrativo a nível do aparelho do Estado.

Como vai ficar essa relação com as suas actividades artísticas, sendo que o Portal Marimba Selutu teve conhecimento que está a preparar um álbum para lançar, inclusive numa das suas músicas teve a participação do músico Abel Dueré?
Eu continuo a fazer o que posso, de acordo o tempo disponível que me resta. Nós temos a música no sangue, isso vem já do tempo do meu pai, que não era um músico profissional, mas pescador, que tocava cordion. E eu vivi numa área onde a música era de facto um emblema.

De que área se refere?
Estou a falar do bairro do Kioxi, onde nasci, em Benguela. Depois vivi na Canata, onde passei a grande parte da minha juventude. E nessas localidades, a música sempre foi um emblema muito forte. Então, é uma coisa que me está intrínseca, certamente não vou conseguir desfazer dela. E, na verdade, é que tenho outras responsabilidades que também me vinculam muito, mas vou tentar dividir o meu tempo, não como cantor, mas também para área da gestão. Pretendo entrar numa instituição que cuida dos assuntos ligados à Arte e da minha actividade profissional.

Vejo a UNAC-SA como uma instituição que precisa de ser relançada de maneira a poder cumprir com os objectivos da sua constituição

Falando exactamente da UNAC-SA, desde 2003 que é membro desta instituição. E hoje, passado mais de 30 de carreira, decidiu entrar na direcção da UNAC. Quais foram os motivos?
Eu estou na UNAC e sinto-me bastante orgulhoso por fazer parte dessa prestigiada instituição há um bom tempo. Nunca tive em funções executivas, porque estas funções são exercidas, nos termos dos estatutos, pelos secretários-gerais, nem mesmo os presidentes são cargos permanentes e executivos. Por isso, acho que não há qualquer incompatibilidade da minha parte, caso seja eleito pelos artistas, em assumir a função de presidente da Comissão Directiva da organização e outras funções que o Governo (Executivo) me queira atribuir no âmbito das minhas faculdades. Vejo a UNAC-SA como uma instituição que precisa de ser relançada de maneira a poder cumprir com os objectivos da sua constituição. Os artistas angolanos não podem continuar a ser vistos como até agora têm sido. Porque, se recorrermos um pouco à História, a nossa Independência Nacional foi conseguida não só pela via das armas, mas também as actividades culturais desempenharam um papel fundamental na luta.

Ainda recorda como este trabalho era desenvolvido na era colonial?
Sim, era através da divulgação das letras de música como o canto, a dança e do teatro. Assim, a mensagem de luta contra a Colonização Portuguesa foi passando até o dia que vivemos hoje. Depois de 1975, a música desempenhou um papel importante. E gostaria de enaltecer não só alguns artistas individuais, mas também alguns conjuntos como o Kissanguela, Kiesos, os Jovens do Prenda, o Fapla-Povo, no qual eu também participei e os Merengues, que é também um conjunto emblemático da nossa praça.

Os músicos precisam ter oportunidade de trabalho e de reconhecimentos das suas capacidades e aptidões

E estes estão quase abandonados. Como pensa trabalhar com eles, caso vença as eleições?
Precisamos de ter uma instituição forte, que possa representar os artistas angolanos e possa fazer com que o Estado cumpra com a parte que lhe compete em relação aos artistas. Para o efeito, todavia, é preciso que a UNAC tenha uma gestão forte, responsável e acima de tudo cultive uma boa relação, quer com os órgãos de tutela, que neste caso é o Ministério da Cultura, mas também com outros departamentos ministeriais, no sentido de serem criadas as condições para que os artistas angolanos sejam reconhecidos. E este reconhecimento a que me refiro, não é apenas do direito do autor, porque este direito não vai resolver o problema de todos. Muitos artistas que lançaram obras há 20 ou 30 anos, algumas dessas obras hoje não tocam ou não são conhecidas. Mas, o que conta é o presente para os direitos de autores. Então, nós pensamos que os artistas não têm necessidades de serem pedintes, mas precisam é de ter oportunidade de trabalho e de reconhecimentos das suas capacidades e aptidões. Nessa perspectiva, a actividade da UNAC deverá ser transversal à cultura: tem de trabalhar com Ministério da Hotelaria, com o do Comércio, com do Trabalho e outros, de maneira que se possa conseguir sinergia para se arregimentar trabalho para os artistas.

Existe um movimento que pretende criar uma instituição homóloga à UNAC no País 

Consegue dizer-nos se a actividade  musical    é  considerada  uma profissão  em  Angola?
De momento, não é reconhecida como profissão. Este é um problema que temos de resolver com o Ministério do trabalho. Se o enfermeiro é uma profissão, o médico é uma profissão e por que o artista de teatro não é uma profissão? Por que o cantor não é uma profissão? Mas, quem tem de resolver esse problema é a UNAC, que é a única, até agora, organização dos artistas e compositores de Angola. Sabe-se que hoje existe um movimento que pretende criar uma instituição homóloga à UNAC no País. Até ao momento, é a quem incumbe esta responsabilidade e isso é que, me motiva a candidatar-me à direcção da UNAC.

Muitos artistas não vejam valências em se associarem…
É verdade. Porque a instituição vive uma situação de hibernação quase total. Portanto, é uma organização, que em primeiro lugar, muitos artistas não se revêem nela. Porque ao longo destes anos fez pouco pelos artistas, não digo que não tenha feito nada, fez alguma coisa, mas não fez o suficiente. Em segundo lugar, é uma instituição que ainda tem muito para dar, mesmo até em homenagem aos seus fundadores, muito deles ainda vivos, outros já não.

Em homenagem a estes cidadãos e artistas, gostaria de merecer o voto de confiança dos colegas para que a minha experiência acumulada ao longo desses anos todos, nas várias funções que tive no país, responsabilidades governamentistas e políticas, penso estar em melhores condições que muitos ou alguns, para contribuir e colocar a UNAC no seu verdadeiro espaço.

PERFIL
Natural de Benguela, por onde nasceu aos 17 de Maio de 1954, José Manuel Moreno Mendes Fernandes, conhecido nas lides culturais como Zeca Moreno, é o candidato da Lista A à liderança da União Nacional dos Artistas e Compositores – Sociedade de Autores (UNAC-SA), licenciado em História pelo Instituto Superior de Ciências de Educação (ISCED). Entre várias funções no aparelho do Estado, o músico desempenhou o cargo de Comissário Municipal do Lobito, foi deputado da Assembleia Popular Provincial, Administrador Municipal de Viana, PCA de uma empresa de prospecção de diamante e desempenha actualmente a função de Director do Gabinete Provincial do Comércio e Indústria do Governo Provincial de Luanda.

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