Direito e Lei – Dário Gaspar

0
232
- Publicidade -

A maior dificuldade, numa apresentação do Direito, não será mostrar o que ele é, mas dissolver as imagens falsas ou distorcidas que muita gente aceita como retrato fiel.

Se procurarmos a palavra que mais frequentemente é associada ao Direito, veremos aparecer a lei, começando pela língua inglesa, em que “law” designa as duas coisas. Mais já deviam servir-nos de advertência contra esta confusão, as outras línguas, em que Direito e lei são indicados por termos distintos: Ius e lex (latim), decrecho e léy (espanhol), dirito e legge (italiano), droin e loi (francês), rechet e gesetz (alemão), pravo e zakanom (russo), jog e tõrveny (húngaro), e assim por diante.

As relações entre Direito e Justiça constituem aspectos fundamentais do meu tema e, de realçar que em ideológicas recobrem a nua realidade das coisas.

Em todo caso, não se trata de um problema de vocabulário. A diversidade das palavras atinge directamente a noção em que dispõe aceitar como Direito.

Os autores ingleses e americanos têm de falar em “right”, e não “law”, quando pretendem referir -se exclusivamente ao Direito, independente da lei ou até, se for o caso, contra ela (isto significa, note o leitor), que o verdadeiro right não possa ser um Direito legal, porém que ele continua a ser Direito, se a lei não o admitisse.

A lei sempre emana do Estado e permanece, última análise, ligada á classe dominante, pois o Estado, como sistema de órgãos que regem a sociedade politicamente organizada, fica sob controlo daqueles que comandam o processo económico, na qualidade de proprietários dos meios de produção. Embora as leis apresentem condições, que não nos permitem rejeitá-las sem exame, como pura expressão dos interesses daquela classe, também não se pode afirmar, ingénua, que toda legislação seja Direito autêntico, legítimo e indiscutível.

Nesta última alternativa, nós nos deixaríamos embrulhar nos “pacotes” legislativo, ditados pela simples conveniência do poder em exercício. A legislação abrange, sempre, a maior ou menor grau, Direito e antidireito: isto é, Direito propriamente dito, reto e correcto, e negação do Direito, entortado pelos interesses clássicos e caprichos continuísticas do poder estabelecido. 

A identificação entre o Direito e a lei pertence, aliás, ao repertório ideológico do Estado, pois na sua posição privilegiada ele desejaria convencer-nos de que cessarem as contradições, que o poder atende ao povo em geral e tudo o que vêm daí é imaculadamente jurídico, não havendo Direito a procurar além ou acima das leis.

Entretanto, a legislação deve ser examinada criticamente, mesmo num país socialista, pois, como nota brilhante Dra° Marilena Chauí, seria utópico/ilusão imaginar que, socializava a propriedade, estivesse feita a transformação social completa.

Isto é acentuado, também, com referência ao Direito, pelo jurista húngaro Dr. Zoltan Péteri, quando assinala que as leis de um país socialista podem não exprimir os resultados da evolução social visada pelos patrões atualizados do socialismo. 

O Direito resulta aprisionado em conjunto de normas provinda do Estado, isto é, as condutas impostas pelo Estado.

O Direito autêntico e global não pode ser isolado em campos de concentração legislativa, pois indica os princípios e normas libertadoras, considerando a lei simples acidente no processo judiciário, e que pode, ou não, transportar as melhores conquistas. Isto depende, é claro que o Estado, concretamente, surge a legislação se ele é autoritário ou democrático; se reveste uma estrutura social espoliativa ou tendente á justiça social efectiva e não apenas demagógica.

Se a classe social que nele prevalece é a trabalhadora ou capitalista; se as bases dominam o processo político ou a burocracia e a tecnocracia servem ao poder incontrolado; se os grupos minoritários têm garantido o seu direito á diferença ou num rolo compromisso os esmaga; se geral, ficam resguardados os Direitos (não menos Direito e até supra-estatais; isto é validade anterior e superior a qualquer lei), chamados Direitos Humanos.

___
Referência bibliográfica

Roberto Lira Filho, 11 edição, editora brasiliense- O que é o Direito. Coleção passo á passo.

Deixe o seu comentário
Artigo anterior“Vencemos o campeonato com rappers e kuduristas”, Alberto José
Próximo artigoMorreu escritor Dario de Melo aos 87 anos

DEIXE O SEU COMENTÁRIO

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui