O alheamento dos artistas angolanos à discussão do OGE foi um inquietante sinal de desapurada competência de mobilização das suas associações, e de fatal incompreensão dos mesmos, do mais importante e soberano momento, para exercerem a real defesa dos seus superiores interesses, junto do Estado Angolano
Belmiro Carlos*
Lamentavelmente, há muito que esse mal faz já morada na vida dos artistas angolanos , e é bem exemplo disso a problemática da gestão dos direitos de autor em Angola.
Desde Março de 1990 que existe em Angola legislação sobre direitos de autor, e pasmem-se até hoje, 28 anos passados, não se faz a gestão dos direitos de autor no País, salvo pontuais e efémeros momentos em que de vara curta se cutucou o Estado, e esse pareceu anuir a cobrança para logo a seguir inventar barreiras e emperrar o processo.
Há cerca de 1 ano elaboramos um texto em que culpabilizávamos o Estado pela desorganização do ambiente artístico nacional e concomitantemente pelo desemprego, desintegração social e económica do Artista angolano, por omissão na aplicação das Leis que produziu para a gestão da Cultura nacional.
No ano passado, num texto intitulado “Diversionismo na Gestão da Propriedade Intelectual”lamentávamos que , apesar da Lei , os artistas viam as suas obras vilipendiadas, violadas, usurpadas e o produto económico das mesmas arrogante e fraudulentamente sonegado, com o apoio do Estado que ia cedendo direitos de exploração à terceiros, sem acautelar os interesses dos autores.
Lamentamos ainda que, enquanto isso, o Estado queimava tempo e dinheiro em acções colaterais que não eram na verdade impactantes para acelerar a solução, de facto e de juri, do problema da gestão dos direitos de autor, em Angola. 08Hoje , 28 anos depois de se legislar sobre direitos de autor nesse País e 4 anos depois da promulgação da última versão sobre a mesma matéria, aí está a verdade, nua e crua.
Não se faz gestão de direitos de autor em Angola, porque o Estado não aprovou ainda o Tarifário de Cobrança , (embora a UNAC-SA tenha há mais de 2 anos avançado com uma proposta).
Não se conhece nenhuma iniciativa do Estado no sentido de regular sobre a gravação e registo das emissões dos operadores de Radio e TV (como acontece noutras paragens) de modos a garantir o envio de playlists das obras e fonogramas difundidos às Entidades de Gestão Colectiva, indicando o título da obra, o intérprete , o executante, o produtor e outros elementos necessários a classificação e distribuição dos direitos, para evitar bagunça na hora de remunerar os artistas.
Não há Regulamento do Direito de Compensação por Cópia Privada prevista na Lei dos Direitos e Autor e Conexos. Disso nem sequer se fala! Talvez a partir de agora e por força do nosso clamor, iremos assistir o desfilar de mais algumas ambíguas peças do obscuro labarinto por que caminha o esforço do Estado na gestão dos direitos de autor em Angola.
Como se vê o próprio Estado que garante a livre constituição de entidades de gestão colectiva, para a defesa dos direitos de autor e conexos, nos termos da Lei, trava o funcionamento das mesmas, igualmente nos termos dessa Lei, por inacção?
Tudo isso deixa claro que, o nível de “consciência de Classse” dos nossos Artistas precisa urgentemente de ser elevada, para que seja ela mesma a lutar , a reivindicar directamente, os seus direitos profissionais e de cidadania, ao invés de afiança-los à terceiros cuja motivação para a causa normalmente fica aquém do desejado.
*Músico e compositor. Este artigo é de inteira responsabilidade do seu autor.