Nagrelha o filósofo do Kuduro e do seu tempo – Agostinho Gayeta

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Nagrelha é o nome artístico de Gelson Caio Manuel Mendes, de 36 anos, natural do Sambizanga, em Luanda. Foto: DR
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A morte de alguém é sempre um evento triste e de grande consternação. Em meio a dor e consternação é de igual modo um momento oportuno para analisarmos o nosso percurso enquanto peregrinos e passageiros deste espaço que se chama terra.

Fazer o bem deve ser uma marca de todos os peregrinos terrestres, pois que, na passagem para outra dimensão nada levaremos e o que ficará não mais nos pertencerá, excepto as memórias que construímos no subconsciente dos outros com as nossas acções.

Joelson Caio Mendes , “Nagrelha” foi um fenómeno da música angolana, no estilo Kuduro. Foi um expoente máximo da expansão, internacionalização e firmamento de um estilo musical estigmatizado, marginalizado e conotado com a bandidagem.

Foi preciso um combatente corajoso, carismático e persistente como o Nagrelha para se juntar à força imprimida por Tony Amado e Sebem em prol da aceitação do Kuduro como um estilo de música e já agora, como uma forma de vida ou se quiserem uma cultura.

O Estado-maior do Kuduro foi um filósofo do seu tempo, no seu estilo, na sua maneira. Foi um autêntico revolucionário da linguagem no estilo de música mais negado e denigrido na sociedade angolana.

Os labregos linguísticos não o impediam de se expressar na língua de Camões, tão-pouco o inibiam na sua performance vocal. Numa linguagem codificada comunicava o seu pensamento com frequente recurso a “adágios” da sua autoria que rapidamente se transformavam em slogan.

A aceitação das suas origens e raízes, a sua lealdade ao seu Mbikoyo, Sambizanga, bairro onde nasceu na capital angolana – Luanda- e o facto de ser destemido e irreverente até mesmo na sua forma de comunicar fez dele um artista único, com uma capacidade inigualável de mobilização de fãs..

Queria Deus que fosse a 18 de Novembro de 2022 o momento certo para chamada à Sua mêrce, com apenas 36 velas apagadas.

Sua meta era 2030 parar de ecoar a sua voz no estilo Kuduro, mas a ingratidão da morte levou-o a resignar mais cedo, quiçá para cantar melhor no coro dos anjos.

Cala-se a voz do artista, mas fica o seu legado. Fica o registo no livro da eternidade as suas acções. Fica de igual modo, para os vivos uma reflexão sobre o nosso percurso, sobre os valores que prezamos e sobre o que enquanto em vida devemos dar mais importância.

Diz o adágio africano: “É quando o homem morre que se conhece como ele viveu”.
Que a terra te seja leve Nagrelha dos Lambas.
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Jornalista, Consultor de Comunicação Estratégica e Presidente da Associação Científica de Angola.

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